Morre Diógenes, amigo de Nelson Gonçalves

Rigoroso e dedicado em tudo que fazia, com lealdade e respeito, ele foi um grande amigo do cantor Nelson Gonçalves, talvez mesmo o mais fiel, e o que reuniu o maior acervo do ‘rei da voz’, consolidado no belo memorial, instalado pela Prefeitura Municipal, no bairro Mochila. Diógenes Carvalho Nunes – ‘Dija’ – perpetuou a obra de Nelson Gonçalves e a sua própria imagem de solidez, seriedade e amizade.

Autêntico guardião da boa música popular brasileira, um dos poucos no cenário regional, deixou-nos no dia 23 de junho, aos 89 anos de idade, Diógenes de Carvalho Nunes, o popularíssimo Dija, que dedicou grande parte da sua existência – e até o final dela – à preservação da obra musical do gaúcho, seu amigo de muito tempo, Nelson Gonçalves. Para ele e para muitos, a mais bela voz masculina do Brasil ou, de uma forma mais simples, ‘a melhor voz do Brasil’.

Nessa luta, ele não apenas tornou-se possuidor do maior acervo discográfico do artista que se tem notícia no país, como, após doá-lo ao Município, voluntariamente passou a cuidar do Memorial de Nelson Gonçalves, instalado ao lado do Centro de Cultura Maestro Miro, no bairro Mochila. Vivia momentos felizes com as obras de recuperação do prédio, o que ele muito agradecia ao prefeito José Ronaldo de Carvalho que, em uma gestão anterior, ao lado do então secretário municipal Antônio Carlos Coelho, foi o responsável pela criação do memorial.

Feirense de nascimento, Diógenes serviu ao Exército Brasileiro em Salvador, onde atuou como jogador profissional no São Cristóvão e Guarany, clubes há muito desaparecidos. Por conta do seu estilo – atacante de extrema raça –, foi convidado por um dirigente do Vitória, mas disse não, fiel à camisa do Bahia. Em 1958, ainda no Exército, Dija assistiu, na Fonte das Pedras, a um show de Nelson Gonçalves, do qual “eu já era fã desde os oito anos de idade”, surgindo uma amizade que se perpetuou. Algumas vezes Dija visitou o cantor no Rio de Janeiro e foi por ele visitado em Feira.

Conhecendo a fundo a história de Nelson, Dija relatava que o artista, de origem portuguesa, nasceu em um navio em águas do Uruguai, e foi batizado em Santana do Livramento, Rio Grande do Sul. Aos três anos de idade foi para São Paulo com a família, criando-se no Brás. Nelson Gonçalves gravou pela primeira vez em 1941 pela RCA Victor, que foi sua única gravadora, e nela superou a casa de 1.200 gravações entre 78 rotações, LPs, compactos simples, compactos duplos e CDs. Todo esse acervo adquirido por Dija integra o Memorial. “Sinto-me bem”, samba de autoria de Ataulfo Alves, e “Se eu pudesse um dia” foram as primeiras músicas gravadas pelo “Rei da Voz”. A última apresentação de Nelson em Feira foi em 1994: “ele estava com febre de 39 graus e só cantou durante 50 minutos”, lembrava. Nelson faleceu em 1998, mas tinha contrato com a RCA Victor até 2002. Todos os discos do cantor, filmes, álbuns, revistas, recortes de jornais, fitas, vídeos estão no Memorial deixado por Dija, até mesmo uma antiga radiola, rádios e outros equipamentos sonoros.

Depois de servir ao Exército e parar prematuramente o futebol profissional, Diógenes voltou para Feira de Santana, casando-se. Trabalhou muito tempo na portaria do Feira Tênis Clube e, posteriormente, na mesma função no Clube de Campo Cajueiro e ainda como cobrador da agremiação social, tornando-se conhecido pela sua austeridade que lhe garantia extrema confiança dos diretores. Só entrava no clube o sócio que estivesse em dia, não abrindo mão dessa prerrogativa para ninguém, razão pela qual era estimado e respeitado por todos. Viveu integralmente. Sua canção preferida de Nelson Gonçalves era a pouco conhecida “A Primeira Mulher”. Fiel ao seu ideário pessoal, com a morte da esposa permaneceu só, nunca admitindo outra ao seu lado. Deixou um filho e uma filha dessa extremada união.

Por Zadir Marques Porto

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