PRÓ NENE: UMA EDUCADORA ETERNIZADA PELAS SUAS QUALIDADES

Professora Nene ou pró Nene, carinhosamente, substituiu seu nome de batismo. Vinda de Itabuna, aqui granjeou profundas amizades e respeito como educadora e líder nata, tornando-se uma legenda no cenário da educação. Josenita Nery Boaventura continua presente entre nós, pelo muito que construiu em vida.

Grapiúna de nascimento, feirense de coração, ela se notabilizou pela sua didática que transcendia as salas de aula, cordial, alegre, comunicativa, mas rigorosa na condução familiar e no ambiente escolar, sempre buscando o melhor para quem dela necessitasse. Josenita Nery Boaventura, muito mais professora Nene ou pró Nene, construiu uma história capitulada com dignidade, esforço e dedicação, o que lhe valeu, dentre outros, o título que ela muito amou e honrou: o de Cidadã Feirense.

Josenita Silva Nery, filha de José Vicente Nery e Jovelina Nery da Silva, nasceu na cidade de Itabuna, em 17 de julho de 1927, e teve uma infância feliz. Seu Vicente, proprietário de uma fazenda de cacau em Uruçuca e negociante de ouro, e dona Jovelina zelavam pela prole, tanto assim que, em 1940, resolveram vir para Feira de Santana, que já despontava progressista e dotada de um estabelecimento capacitado para a formação de professores, ou profissionais do magistério: a Escola Normal, que funcionava no prédio do atual Centro Universitário de Cultura e Arte (CUCA), na Rua Conselheiro Franco.

Ainda normalista, Josenita conheceu o jovem Sófocles Boaventura, filho de Lídia Soares Boaventura e Aguinaldo Soares Boaventura, que foi prefeito de Feira de Santana (1948/1951). Estudioso do grego e de outros idiomas, Aguinaldo premiou os filhos com nomes raros como Asdrúbal, Aristóteles, Aristófanes e Aníbal. À exceção de Sófocles e da irmã Antonieta, mas, a exemplo do pai, todos foram dedicados à cultura física e famosos com títulos pan-americanos. Romântico, Sófocles tocava violão e fazia serestas para a namorada, cantando músicas de Nelson Gonçalves, Ataulfo Alves, Miltinho, Irakitan, Francisco Egídio e outros valores da época.

Por um desentendimento familiar, aos 18 anos, Sófocles resolveu ir para Salvador, fazendo a pé os 110 km que separam as duas cidades. Caprichoso, sem querer depender da família, trabalhou como contínuo do Banco da Bahia, emprego humilde. Mesmo assim, casou-se com Josenita, que não se escusou de enfrentar as dificuldades iniciais, superadas à medida que ele foi subindo de posição, quase chegando à gerência do estabelecimento. No início, ainda solteiro, como só possuía uma camisa branca, que era obrigatória no banco, Sófocles lavava a peça para vesti-la na manhã seguinte. Quando a camisa não enxugava naturalmente, ele fazia isso com o ferro de passar.

Zozô ou Zô, como ele era chamado na intimidade, e Josenita se queriam, e o enlace ocorreu na capital baiana em 1950. Moravam no Acupe de Brotas, onde nasceram o advogado e economista Miguel Ângelo e a professora de geografia Vitória. Em Salvador, Josenita Nery começou a exercer a profissão e passou a ser Inspetora Escolar. Em 1957, Sófocles foi picado por um “barbeiro”, inseto responsável pela transmissão da doença de Chagas, que lhe foi fatal pouco tempo depois. Viúva e com dois filhos menores (Miguel Ângelo, cinco anos, e Vitória, um ano e meio), a professora Josenita voltou para Feira de Santana em 1957.

Além de Inspetora Escolar, Josenita mantinha uma escola primária na garagem da residência, na Rua Barão do Rio Branco. Demonstrando dinâmica e capacidade, passou a ensinar no Ginásio Santanópolis, a convite do deputado estadual Áureo Filho, fundador e diretor do estabelecimento. Trabalhou também na rede estadual de educação, no Instituto de Educação Gastão Guimarães (IEGG). Foi diretora de turnos em ambos e diretora-geral durante duas décadas do IEGG, marcando sua administração escolar com seriedade e avanço socioeducacional. Incentivava a prática esportiva, a manutenção da fanfarra, que se destacava nos desfiles cívicos, a exemplo do 7 de Setembro, o grupo de Bandeirantes e atividades artísticas, como a pintura de painéis do muro do IEGG por vários artistas locais.

Perfeitamente entrosada com a estudantada e entendendo seus anseios, concebeu, com lideranças escolares, as matinês dançantes nos finais de semana e domingos no IEGG, que iam das 18 às 22 horas, com apresentação de bandas musicais da cidade, como Os Trogloditas, Os Leopardos e outros. Amiga e admiradora do líder político baiano Antônio Carlos Magalhães, jamais cedeu aos convites para uma candidatura à Câmara Municipal. Devotava também profunda amizade ao prefeito José Ronaldo de Carvalho. Sensível, gostava de música romântica, até mesmo de Waldick Soriano, que sofria preconceito de “bregueiro”.

O advogado Miguel Ângelo conta que, ao final de um show no Feira Tênis Clube, pediu um autógrafo a Waldick que, com seu jeitão despachado, foi logo dizendo: “Não dou autógrafo para homem”. Miguel Ângelo retrucou: “É para minha mãe, professora Josenita”, e imediatamente Waldick concedeu o autógrafo, que ele guardava com respeito. Com a moderação que lhe era peculiar, a professora Nene era fiel torcedora do Fluminense de Feira e do Flamengo. A leitura, em especial de autores brasileiros, ocupava o seu pouco tempo vago. Machado de Assis, José de Alencar, Jorge Amado, Guimarães Rosa, José Lins do Rego faziam parte da sua preferência.

Depois de cumprir integralmente sua missão terrena de mulher, mãe, educadora, amiga, conselheira, Josenita Nery Boaventura, pró Nene, tornou-se saudade no dia 12 de outubro de 2004.

Por Zadir Marques Porto

Fonte: Prefeitura de Feira de Santana

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima